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Foto do escritorNURI

Os impactos da Primavera Árabe na integração regional



Apesar de a Primavera Árabe ter sido um evento apresentado com muito alarde pela imprensa internacional, acontecimentos vão sendo publicados nos mais diversos jornais, sem, contudo, apresentar uma análise sobre os possíveis impactos desse acontecimento histórico na realidade interna dos Estados em questão e mesmo das suas relações interestatais e implicações para a região nas quais se encontram.

De fato, a Primavera Árabe, iniciada em dezembro de 2010 por uma manifestação individual na qual um tunisiano ateou fogo ao próprio corpo protestando contra as condições de vida no seu país, desencadeou revoltas populares que geraram queda do regime de Zine el-Abdine Ben Ali, na Tunísia e Hosni Mubarak, após 30 anos no poder no Egito. Além dessas deposições, as manifestações se alastram alcançando a Líbia, quando Muamar Kadafi, no poder desde 1969, também cai, e no Iêmen Ali Abdulah é substituído por seu vice-presidente, Abd Rabbuh Mansur al-Radi.

Tais acontecimentos mostram a determinação dos povos da região na luta contra a corrupção, o autoritarismo e a falta de oportunidades; mas também o envolvimento de forças ocidentais, sob o pretexto da autodeterminação dos povos, como no caso do envolvimento da OTAN na queda do ditador líbio. Mas afinal, esses levantes populares geram de fato uma mudança regional rumo à estabilização interna, regularização da situação social e, por fim, integração regional?

Faz-se necessário expor aqui os problemas que afligem o continente africano, como dependência econômica e conflitos étnicos e intolerância religiosa que possuem fortes raízes históricas, além, claro, da apresentação de fatores semelhantes na Ásia. Tais problemas não deixaram de existir no pós-Primavera Árabe, o que gera certa dúvida quanto a uma harmonia na região que possibilite a integração futura de países como Líbia, Egito, Síria e Iêmen.

Como se sabe, a África é marcada por colonizações europeias e, historicamente, as associações surgidas entre os países africanos são consequências de vinculações geradas pelo domínio colonial de uma metrópole em comum. Exemplificações podem ser dadas com alguns dos países envolvidos na Primavera Árabe: a Tunísia foi ocupada por franceses, o Egito por britânicos, a Líbia, por sua vez, pela Itália.

As integrações em andamento: (como é dito por Bela Balassa as integrações regionais podem ser vistas como um estado de coisas como também como um processo) a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral (SADC), a Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (ECOWAS) e afirmar que nenhuma dessas integrações são compostas por Estados da Primavera Árabe.

Mesmo considerando essas evidências que apontam uma integração, mesmo sem participação dos países envolvidos na Primavera Árabe, deve ser notado, no caso da África, que o nascimento do SADC é fruto da falta de coesão do continente, uma vez que essa comunidade foi proposta com o objetivo inicial de impedir a proeminência econômica da África do Sul.

A integração africana em um contexto geral também emperra em problemas de ordem política e econômica – uma vez que as assimetrias entre os países e a falta de complementaridade econômica entre eles devem ser consideradas como fator que complica ainda mais um sucesso nas integrações.

De fato, regimes ditatoriais e autoritários deixaram o poder com os levantes populares, no entanto, como está sendo exposto, as antigas questões que já geraram conflitos seguem existindo e, em alguns casos, encontrando na Primavera Árabe, um risco de agravamento. O extremismo religioso, por exemplo, evidenciado na Tunísia com a criação do CAAR, um comitê de “Associação de sensibilização e Reforma centrista”, legalizado por Ali Larayedh, líder do partido eleito – Ennahda – após a queda Zine el-Abdine.

Apesar da predominância do Islamismo na Tunísia, afirmações como “mulheres sem véu merecem queimar no inferno” mostram o extremismo e inflexibilidade do CAAR aterroriza minorias religiosas.

A inquietação da população em relação a extremismos religiosos é evidenciada em manifestações populares na Tunísia, quando 1.200 tunisianos foram às ruas protestar contra a apologia feita pelo pregador egípcio Wajdi Ghenim à mutilação genital femenina; no Iêmen, onde o governo de Abd Rabbuh Mansur al-Radi luta para restaurar a estabilidade e controle no sul, num panorama de difícil solução, com o envolvimento inclusive do grupo Al Queada. Na Líbia, grupos étnicos lutam contra milícias árabes – só no mês passado conflitos envolvendo a tribo Sabha e a tribo Toubou geraram cerca de cinquenta mortos.

A situação econômica não ajuda na estabilidade interna dos países; as instabilidades causadas pelas revoltas que caracterizaram a Primavera Árabe comprometeram a comercialização do ouro negro, gerou queda do PIB regional de US$ 20,6 bilhões e prejuízos na conta pública de US$ 35,3 bilhões. A população, que já não contava com um suporte social por parte dos antigos governos, se veem numa situação delicada e as contas públicas em igual ou pior situação, uma vez que a arrecadação reduziu e os gastos públicos devem aumentar, numa forma de mostrar a preocupação dos novos governos com a situação social.

Deve haver um questionamento de se, de fato, houve real mudança com a queda dos antigos regimes. O que se vê é que, se o povo ainda está submetido a influências políticas – externas aos países e de empresários, como é o caso do Egito, com o vice-presidente da Irmandade Mulçumana, partido islâmico eleito no Egito.

A esse cenário de complexas questões somam-se as pretensões estadunidenses e europeias por aumento da esfera de influência na região, em detrimento da Rússia e China. Uma maneira de analisar a postura adotada pelos Estados Unidos nesse sentido é que estes vêem na Primavera Árabe uma maneira de derrubar o governo de al-Assad e, dessa forma, diminuir a influência russa, além de exercer pressão visando o rompimento das relações de sírios e libaneses como Irã e Iraque. Assim, Síria e Líbia, além de terem de lidar com os seus desafios internos sofrem com tal disputa que envolve China, Rússia, Estados Unidos e países da União Europeia. Iêmen e Líbia também se tornam alvo da disputa entre Estados Unidos e Rússia pelas bases navais que ambos pretendem instalar.

Assim, se já havia problemas graves dificultando uma aproximação no relacionamento desses países, as rivalidades externas estão ganhando espaço através de influências políticas promovendo rompimento de relações, como já foi dito, dos países da região.

Se há realmente uma interação entre os países da Primavera Árabe ou os fronteiriços a eles esta é marcada de tensões, não apresentando perspectivas positivas de mudança. Não é visto sinal de integração regional, harmonia social interna tampouco interestatal. Por enquanto, o que podemos testemunhar de cooperação entre tais países é o Plano Tríplice que exige cooperação entre Líbia, Egito, Argélia, Sudão e entre outros países não para um objetivo de integrar tais países, mas puramente como uma maneira de tentar frear os problemas internos – que acabam ultrapassando as fronteiras e interligando-se – ao propor reforço fronteiriço para combater as milícias e o contrabando de armas que foi alimentado pelos saques realizados ao arsenal líbio, após a queda de Kadafi e podem somar-se ao arsenal do grupo Al-Queada.


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