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14 Pontos de Wilson e o pensamento kantiano


O livro “À Paz Perpétua”, escrito em 1795 por Immanuel Kant, é uma referência atemporal para os teóricos liberais e neoliberais das Relações Internacionais. Seu pensamento político descrito nesta obra objetiva orientar de que forma as sociedades devem se organizar para que os conflitos não mais existam com o tempo. Para tanto, orienta que os Estados devem se organizar enquanto repúblicas democráticas, pois essa forma de organização política faz com que os Estados levem sempre em conta o interesse dos indivíduos, que em linhas gerais tendem a ser contra guerras. Logicamente que nem todos os setores da sociedade são ouvidos e, consequentemente, não tem seus interesses representados. O que ocorre é que o Estado, que por esta concepção não é ator fundamental das relações internacionais, é mero representante de grupos internos; aqueles que se organizam melhor terão seus interesses representados.

Portanto, além de terem de se organizar em repúblicas, os Estados tem de observar e respeitar a soberania alheia. Isso para Kant se daria através da criação e respeito a regras estabelecidas (Direito Internacional) entre estes Estados. Essas regras seriam estabelecidas ante a criação de um federalismo republicano, que manteria a soberania dos seus membros, porém limitando suas ações em alguns setores com o intuito de evitar conflitos.


Dessa forma, essa tradição de pensamento tem como cerne a comunidade de indivíduos, e não os Estados. São os governantes quem desejam as guerras, não o povo comum. Surge daí, então a ideia de cosmopolitismo, ou Lei Cosmopolitana, que para Kant é o tratamento hospitaleiro dado aos estrangeiros, com o intuito de promover o comércio e o turismo entre estes países, e não o direito à cidadania simplesmente. Esse cosmopolitismo seria possível graças à uma ética universal, baseada na razão, que seria determinante para o fim de conflitos e a concretização do cosmopolitismo.

O ex-presidente estadunidense Woodrow Wilson, no dia 8 de janeiro de 1918, listou e apresentou ao Congresso do seu país os 14 pontos que para ele eram necessários para o estabelecimento da paz, e resumia suas ideias e ideais a respeito da política internacional. Em alguns destes pontos podem ser encontradas bases filosóficas do pensamento kantiano, sendo eles:

– o 1º ponto de Wilson: “Pactos de paz, sem acordos secretos posteriores, diplomacia franca e pública”. Este ponto tem referência direta com a primeira seção encontrada no livro de Kant, onde o mesmo afirma que “nenhum tratado deve ser tomado como tal se tiver sido feito com reserva secreta de matéria para uma guerra futura”. Ou seja, o que se propõe aqui, por ambos, é que a diplomacia seja aberta e sincera, sem que haja objetivos outros por trás do acordado.

– o 4º ponto diz: “Redução dos armamentos nacionais até o menor nível necessário para garantir a segurança nacional”. Também se pode associar ao pensamento kantiano, que afirma que “exércitos permanentes (miles perpetus) devem desaparecer completamente com o tempo”. Para ele os exércitos permanentes teriam de ser desfeitos, sendo organizados apenas em casos de necessidade extrema.

– o 14º ponto em que Wilson propõe a “criação de uma associação geral de nações sob pactos específicos com o propósito de fornecer garantias mútuas de independência política e integridade territorial dos grandes e pequenos Estados”. Para Kant, o caminho para a paz perpétua passaria, necessariamente, pela criação de um federalismo de países republicanos, de Estados livres. Do pensamento de Wilson surge uma Organização Internacional Governamental, a Liga das Nações, que difere do federalismo kantiano em alguns aspectos gerais. Porém o objetivo é o mesmo, a cooperação e a regulamentação internacional preservando a soberania dos Estados e objetivando o estabelecimento e a manutenção da paz. Aqui se percebe também a questão relativa ao Direito Internacional (conceito que viria a ser desenvolvido mais profundamente por Grotius).

Os pontos 5 ao 13 são fundamentados também em conceitos kantianos, isso porque este afirma que “nenhum Estado independente (pequeno ou grande, isso tanto faz aqui) pode ser adquirido por um outro Estado por herança, troca, compra ou doação” e que “nenhum Estado deve imiscuir-se com emprego de força na constituição e no governo de um outro Estado”. Wilson discorre nestes pontos sobre retiradas de exércitos, restabelecimento da soberania, reconhecimento de autonomia, independência, reajuste de fronteiras, etc., dando clara evidência da influência do pensamento de Kant em suas ideias.


Nota-se, portanto, que apesar de escrita em fins do século XVII, a obra de Kant influenciou o pensamento Liberal das Relações Internacionais e também o neoliberal, por dispor das bases necessárias para o desenvolvimento de tais campos teóricos de análise. A criação de organizações internacionais, de comunidades internacionais, a cooperação institucionalizada, tudo isso perpassa por bases conceituais já estabelecidas por este que é um clássico não apenas para as Relações Internacionais, mas também para outros ramos do conhecimento.


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