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“A Substância” do Etarismo: Quando a idade se torna invisível e à juventude leva o Oscar.

  • Daniela Mendes
  • há 2 minutos
  • 4 min de leitura

Por: Daniela Mendes Viana Freire. 


O etarismo, ou discriminação por idade, é uma questão persistente na sociedade contemporânea, que se manifesta de forma acentuada na indústria do cinema. Mulheres maduras enfrentam frequentemente desafios relacionados à valorização de sua imagem e talento, sendo substituídas por atrizes mais jovens. O filme “A Substância" (2024), aborda essa temática ao retratar a trajetória de uma atriz madura em busca de relevância em um ambiente que privilegia a juventude.


A 97ª edição do Oscar trouxe à tona essa discussão ao conceder o prêmio de Melhor Atriz à jovem americana Mikey Madison, no lugar da atriz Demi Moore, cuja atuação em “A Substância" foi amplamente aclamada. Essa decisão gerou críticas e gerou debates sobre o verdadeiro lugar das atrizes mais velhas na indústria. Se, por um lado, Hollywood tem promovido discursos de diversidade, por outro, a premiação reforça a tendência de invisibilizar mulheres que ultrapassam uma determinada faixa etária.


Dirigido pela francesa Coralie Fargeat, “A Substância”  (2024) narra a história de uma atriz envelhecida que luta contra a marginalização em uma indústria obcecada pela juventude. O filme expõe como os corpos femininos são objetificados e descartados à medida que envelhecem, oferecendo uma forte crítica ao etarismo enraizado em Hollywood. A narrativa reflete a realidade de muitas atrizes que, ao atingirem determinada idade, veem suas oportunidades de trabalho diminuírem significativamente. Demi Moore, como protagonista, trouxe uma camada adicional de complicações ao papel, dada sua própria trajetória na indústria cinematográfica. Sua escolha para o papel não foi apenas uma decisão artística, mas um ato simbólico, um espelho da discriminação que a atriz e tantas outras já enfrentaram na vida real.


A cerimônia do Oscar de 2025 destacou-se pela vitória de Mikey Madison, de 25 anos, na categoria de Melhor Atriz, por sua atuação em Anora (2024). Madison superou concorrentes de peso, incluindo Demi Moore e a brasileira Fernanda Torres, que eram consideradas as  favoritas por sua performance em A Substância e Ainda Estou Aqui. Essa decisão gerou debates sobre a perpetuação do etarismo na indústria cinematográfica. A ironia desse cenário não passou despercebida: um filme que critica a obsessão pela juventude perdeu justamente para uma atriz jovem. Isso reforça a ideia de que, mesmo quando o tema é debatido abertamente, o sistema resiste a mudanças concretas.


Ademais, a notícia da mídia e do público evidenciou como a idade das atrizes continua sendo um sorteio implícito na avaliação de performances. Manchetes destacou a idade de Moore como um fator relevante, enquanto a vitória de Madison foi tratada como uma celebração de um “novo talento”, reforçando a tendência de Hollywood em exaltar a juventude enquanto relega ao esquecimento artistas mais experientes.


A derrota de Demi Moore no Oscar gerou divulgação nas redes sociais e na mídia especializada sobre o etarismo na indústria do entretenimento. Muitas atrizes manifestaram apoio a Moore, destacando como a premiação reflete padrões de exclusão de mulheres maduras. Em entrevista ao The New York Times, Moore refletiu sobre a marginalização baseada na idade e enfatizou a importância de valorizar o talento independente da faixa etária. Além disso, a crítica especializada acredita que essa tendência não se aplica da mesma forma aos homens. Atores mais velhos continuam a ser valorizados e indicados a prêmios importantes, enquanto as atrizes, ao envelhecerem, encontram dificuldades para obter papéis de destaque. Essa desigualdade reforça a necessidade de um debate mais amplo sobre a igualdade de gênero na indústria cinematográfica e a desconstrução dos estereótipos que associam o envelhecimento feminino à perda de relevância.


O etarismo na indústria cinematográfica pode ser explorado à luz das teorias feministas e Queer das Relações Internacionais, que questionam as estruturas normativas de poder e identidades. A teoria feminista das RI enfatiza como o gênero e outras categorias sociais estruturam as relações de poder, expondo como o patriarcado perpetua desigualdades. No contexto de Hollywood, a valorização da juventude feminina e a invisibilização de atrizes mais velhas refletem essa lógica, pois o envelhecimento das mulheres é tratado como um fator de desvalorização, enquanto a maturidade dos homens é associada à autoridade e ao prestígio.


Já a teoria queer das RI, inspirada emautoras como Judith Butler, problematiza as normas que regulam corpos e identidades. A imposição de um padrão de juventude como estratégia de sucesso para as mulheres reforça uma lógica que define o "aceitável" e o "descartável" na indústria cinematográfica. A estreia de uma atriz jovem em detrimento de uma mais velha, mesmo quando o tema do filme é premiado pela crítica, trata-se de uma discriminação que revela como as estruturas normativas resistem às mudanças, perpetuando desigualdades de gênero e idade.


Nessa perspectiva, a vitória de Mikey Madison no Oscar de 2025 simboliza a continuidade dessas normas, enquanto a atuação de Demi Moore e a narrativa de “A Substância” desafiam essa lógica. O fato de Hollywood celebrar a diversidade em discursos, mas manter práticas discriminatórias, reforça a necessidade de um olhar crítico sobre as dinâmicas de poder que operam no cinema e na sociedade de forma mais ampla.


Referências 


BUTLER, J. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.


CORRÊA, L. Envelhecimento feminino e etarismo nas organizações: o desafio da mulher madura no mundo do trabalho. Organicom, v. 20, n. 41, 2023. Disponível em: https://doi.org/10.11606/issn.2238-2593.organicom.2023.206721. Acesso em: 17 mar. 2025. 


ENLOE, C. Bananas, Beaches and Bases: Making Feminist Sense of International Politics. University of California Press, 2014.


OSÓRIO, T. Oscar de melhor atriz reforça crítica de "A Substância" ao etarismo em Hollywood? GZH, 03 mar. 2025. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/colunistas/ticiano-osorio/noticia/2025/03/oscar-de-melhor-atriz-reforca-critica-de-a-substancia-ao-etarismo-em-hollywood-cm7sq53yc00000138dhiu0g9o.html. Acesso em: 17 mar. 2025.


HAGEN, J; BROWNE, A. Queer Experiences Within the Bounds of International Relations. SageJournals, v. 49, issue 3, p. 190-197, 2024. 


TIME. Oscars Viewers See 'The Substance' Parallels in Demi Moore's Academy Award Fate. Time, 03 mar. 2025. Disponível em: https://time.com/7263726/demi-moore-substance-oscars-best-actress-academy-award-loss-reactions/. Acesso em: 18 mar. 2025.


GLAMOUR. Demi Moore's Oscars Loss Doesn't Take Away from Her Impact. Glamour, 03 mar. 2025. Disponível em: https://www.glamour.com/story/demi-moores-oscars-loss-doesnt-take-away-from-her-impact. Acesso em: 18 mar. 2025. 


 
 
 

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