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Exportação de grãos na economia ucraniana: impactos internos e externos




Carlos Almir

Lara Lucas



É natural pensar que o conflito entre Rússia e Ucrânia, além das consequências geopolíticas, impacte também a conjuntura econômica mundial, tendo em vista o potencial produtivo que as duas ex-repúblicas soviéticas possuem, em especial no que tange à agricultura. De acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, em levantamento divulgado esse ano, a Ucrânia possui cerca de 55% de sua terra arável, com suas exportações no setor gerando 14% dos empregos da população ucraniana. O país mantinha posição privilegiada no comércio internacional de grãos, estando entre os dez maiores exportadores de milho, cevada e trigo, sendo o último historicamente associado ao país, tendo até mesmo rendido à Ucrânia o apelido de “Cesta de Pão da Europa”. Dentre os principais destinos do trigo ucraniano pode-se destacar países como Egito, Turquia, Paquistão e Bangladesh, sendo essas relações comerciais um dos motivos para os ucranianos conservarem papel crucial no abastecimento global de alimentos.

Deflagrado em meados de fevereiro, o conflito entre os dois países trouxe prejuízos à maior parte da sociedade ucraniana. No setor agrícola houve a invasão de 3.8 milhões de hectares por parte da Rússia, o que diminuiu em 20% a área de plantação do trigo ucraniano. A relação entre esses dois Estados, no que diz respeito à agricultura, afeta todo o mundo. O trigo é uma commodity com preço extremamente volátil, variando bastante por questões geopolíticas e climáticas. Dito isso, por exemplo, se o preço da energia sobe, aumenta-se também o valor gasto nas fazendas e no transporte de trigo para os mercados, assim como o valor dos fertilizantes. Por esses países juntos serem responsáveis por cerca de ¼ da exportação global de trigo, no momento em que a Ucrânia foi invadida esse produto presenciou uma alta em seu preço, com seu bushel indo de $7.70 para $13, alta mantida até meados de junho, quando o preço se estabilizou em por volta de $8. Essa oscilação se deu, principalmente, pela restrição do fluxo de gás natural por parte da Rússia, tendo em vista seu papel na produção de fertilizantes como amônia e ureia, importantes para as plantações. Entretanto, a situação não demorou a ser contornada, sendo o problema solucionado pelo acréscimo na oferta de colheitas.

Além da questão do gás, a Ucrânia enfrentou o fechamento de alguns de seus portos mais importantes. Contudo, no dia 22 de julho, em Istambul, foi assinado um acordo entre Rússia e Ucrânia, sob mediação da ONU, no que diz respeito à reabertura dos portos ucranianos no Mar Negro. O local é estratégico, visto que é a partir dessa região onde ocorre o escoamento da produção de grãos da Ucrânia, algo que tem sido fortemente prejudicado desde quando ganhou corpo o conflito entre os dois países. O local de assinatura não foi escolhido por acaso: soberana nos estreitos de Bósforo e Dardanelos, indispensáveis para a estratégia de escoamento da produção ucraniana de grãos a partir do Mar Negro, a Turquia mantém boas relações com Ucrânia e Rússia, servindo, também, como entreposto comercial naquela região. Após a reunião, entretanto, houve ataques a alguns portos ucranianos naquela localidade, em especial ao de Odessa. Em comunicado, a Organização das Nações Unidas (ONU) cujo secretário-geral, Antonio Guterres, se fez presente na assinatura do acordo, lamentou o ocorrido e relembrou que os grãos que partem da Ucrânia são parte integrante de uma estratégia global de combate à fome, reiterando que uma interferência forte em sua distribuição pode trazer prejuízos em escala global. Apesar dos estresses militares, a ONU afirmou esperar um cumprimento do acordo nas semanas subsequentes.



Estreitos de Bósforo e Dardanelos.


Na esteira dos avanços dessas tratativas, em entrevista prestada à Reuters no dia 25 de agosto, Yulia Svyrydenko, ministra da economia e vice-premiê ucraniana, destacou uma previsão macroeconômica. A partir dela, esperaria-se a estabilização econômica do país ao final do ano, que seria acompanhada por um crescimento de 15,5% em 2023, logo após uma retração esperada de 30-35% em 2022. Nota-se cautela na fala da ministra, principalmente quando reafirma que o reaquecimento da atividade econômica está intrinsecamente ligado aos desdobramentos no campo de batalha. Entretanto, chama a atenção uma colocação otimista quanto ao futuro próximo da economia de um país que se vê em conflito direto contra um vizinho militarmente mais poderoso. Isso levanta dúvidas sobre o que é, de fato, possível em uma perspectiva econômica nessa situação, podendo tal declaração servir apenas como motivação ao povo ucraniano, que tem visto sua moral ser fortemente abalada por conta da crise.

Portanto, nota-se que a situação entre Rússia e Ucrânia se mostra repleta de incertezas, gerando prejuízos consideráveis à cadeia produtiva da economia mundial. Apesar de haver indicativos positivos, que comprovam que a retomada do crescimento econômico da Ucrânia virá através da estabilização do preço de suas commodities mais proeminentes, é precipitado apontar progresso ao traçar uma linha temporal dos acontecimentos, visto que as tensões entre os dois países não dão indício de um fim próximo.











REFERÊNCIAS


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CNN. Secretário-geral da ONU condena ataques ao porto ucraniano de Odessa. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/secretario-geral-da-onu-condena-ataques-ao-porto-ucraniano-de-odessa/>. Acesso em: 1 set. 2022.

ISTOÉ DINHEIRO. Safra de trigo da Ucrânia em 2023 deve cair para 15 mi t, diz conselho agrário. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/safra-de-trigo-da-7/>. Acesso em: 2 set. 2022.

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RENNISON, J. The New York Times. War, Climate Change, Energy Costs: How the Wheat Market Has Been Upended. Disponível em: <https://www.nytimes.com/2022/08/01/business/wheat-ukraine-war-market.html>. Acesso em: 1 set. 2022.


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‌U.S. DEPARTMENT OF AGRICULTURE. Ukraine Agricultural Production and Trade, April 2022. Disponível em: <https://www.fas.usda.gov/sites/default/files/2022-04/Ukraine-Factsheet-April2022.pdf>. Acesso em: 2 set. 2022.

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