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OBSERVATÓRIO

O cenário incontestável do somatório de crises no Haiti



O território haitiano foi cenário de diversos acontecimentos desde sua colonização até o presente momento. Como o primeiro país latino-americano a ter sua independência, foi palco de diversas guerras territoriais no decorrer de sua estrutura histórico-política, o que levou a crises de poder, ocasionando o desenvolvimento de instabilidades políticas e econômicas. O Haiti é um país que sofre com sucessivos desastres naturais, violência de gangues armadas, contínua violação dos direitos humanos pela polícia local, que foram agravados com a pandemia do coronavírus em meio ao ápice de uma crise política, seguida por uma crise humanitária.


A crise política atual no Haiti antecede o assasinato do presidente Jonevel Moïse, no dia 7 de julho de 2021, tendo em vista que sua chegada ao poder foi repleta de entraves que levaram ao atentado. Moïse lançou sua candidatura em 2015 pelo partido Tèt Kale (PHTK) mas, com as denúncias de fraude, seu concorrente Jude Celestin, recusou-se participar do segundo turno, o que levou a presidência interina de Jocelerme Privert até a data da nova eleição em novembro de 2016, a qual Moïse foi vitorioso com 55,60% dos votos.


Com o decorrer de seu mandato, entre os anos de 2017 a 2019, surgiram acusações de lavagem de dinheiro por meio das empresas de Moïse que teriam sido beneficiadas com projetos milionários que não foram executados e a data final de seu encargo gerava controvérsias e tensões. No entanto, a dissolução do Parlamento em 2020 e passou a governar por meio de decreto, simultaneamente com a pandemia fez com que a insatisfação da população haitiana crescesse. Estes fatores conduziram a manifestações pedindo a renúncia presidencial, que foram reprimidas com violência por parte dos militares a mando do governo.


Em 7 de fevereiro de 2021, Moïse se recusou a deixar a presidência do país alegando que o período de 5 anos de seu mandato não havia acabado como estava sendo afirmado por sua oposição política e a sociedade civil, porém, o presidente argumentou com "[...] base o artigo 134-1 da Constituição haitiana, que afirma que o tempo de mandato deve ser contado a partir do momento que o político assume o cargo […]" (Correio do Povo, 2021) a sua permanência até fevereiro de 2022, diante do período da presidência interina de seu antecessor Privert. Em fevereiro desde ano, no dia 7, o presidente afirmou que sofreu o primeiro atentado de assasinato e uma tentativa de golpe de Estado, foram presas 20 pessoas acusadas de complô e entre elas encontrava-se o juiz Yvickel Dabrésil da Suprema Corte do Haiti, sendo representante do poder judiciário e como presidente provisório se houvesse a saída de Moïse.


Após os acontecimentos, a oposição haitiana anunciou que seria nomeada uma nova Comissão de Transição, a escolha do presidente interino e em dois anos aconteceriam novas eleições, mas, em abril, Moïse estabeleceu o referendo que ocasionaria reformas na Constituição e entre estas estaria a permissão de reeleição presidencial em mandatos consecutivos, proibido no Haiti desde o fim ditatorial em 1986.


Em consequência a todos os fatores apresentados em seu governo, somado ao fato de o país estar imerso em diferentes crises, cinco meses após a primeira tentativa de assassinato, o presidente Jonevel Moïses sofreu mais um atentado que, desta vez, provocou a sua morte em julho deste ano. O relato afirma que homens armados invadiram pela madrugada a residência localizada no bairro Pelerin, na capital Porto Príncipe, onde Moïse foi baleado diversas vezes e já encontrava-se sem vida quando foi socorrido. A primeira-dama Martine Moîse também foi baleada mas, seguiu para o hospital e sobreviveu aos ferimentos. Pela manhã, o primeiro-ministro interino Claude Joseph declarou em nota que a população precisava manter a calma enquanto era normalizada a ordem no país pela polícia e Exército, juntamente foi instaurado estado de sítio no Haiti.


Além das ocorrências na política, o Estado haitiano foi cenário de consecutivos desastres naturais desde o dia 14 de agosto de 2021 onde enfrentaram terremotos e o ciclone Grace. Localizado na região da ilha de Hispanhola, no Caribe, a explicação diante dos casos é que o país "[...] se encontra integralmente sobre a placa do Caribe, que faz contato com outras três placas: Norte-Americana, Sul-Americana e de Cocos." (GUITARRARA. Brasil Escola, 2021) situado em uma área de elevada instabilidade tectônica.


Com magnitude de 7.2 graus na Escala Richter, um terremoto atingiu a ilha deixando um número aproximado de 6.000 feridos, 1.419 mortos e milhares de desabrigados (G1,2021), em 14 de agosto desde ano, com tremores secundários no dia seguinte que atingiram 5.9 graus e gerando alertas de tsunamis. Em 2010 um terremoto de 7 graus na Escala Richter deixou o Haiti em escombros, "[...] causando a morte de mais de 300 mil pessoas. Outras centenas de milhares de pessoas ficaram feridas, e aproximadamente 1,5 milhão de pessoas perderam as suas casas." (GUITARRARA. Brasil Escola, 2021).


O primeiro sismo que ocorreu deixou o país em grave estado "[...] destruiu 2.868 edificações e danificou 5.410, disseram as autoridades." (G1, 2021), os suprimentos necessários ficaram impossibilitados de chegar aos hospitais pela obstrução das estradas pelos destroços. As presentes dificuldades foram agravadas na noite do dia 16 de agosto, com a passagem do ciclone Grace. Como já havia sido comunicada sua trajetória pelo Centro Nacional de Furacões dos Estados Unidos (NHC), aconteceriam fortes chuvas e ventos com até 75km/h, fazendo com que os riscos de enchentes e deslizamentos fossem intensificados. Até a manhã do dia 17 o número de vítimas subiu com o somatório dos desastres, contabilizando 2.189 mortos e doze mil feridos.


A intensificação das crises política e humanitária agravaram a situação da população haitiana, sendo decretado o estado de emergência por 30 dias pelo primeiro-ministro Ariel Henry. Com relatos de moradores que trazem a realidade daqueles que foram esquecidos pela mídia e Comunidade Internacional, "A situação política agrava ainda mais o problema. Não temos governo, ninguém o reconhece. E não sobrou nenhum branco no país [em alusão à falta de presença de organizações humanitárias internacionais]." (PAÚL. BBC News Mundo, 2021), o Haiti passa pela dificuldade de mobilizar recursos do governo para apoio às vítimas e sem uma rede de apoio dos Estados.


Aos que permaneceram, a incerteza apenas cresce, com uma população desabrigada que passa fome e enfrenta riscos diários de deslizamentos, enchentes, corte de energia elétrica e água, deixa aqueles que estão a frente de organizações como Cruz Vermelha e Médicos Sem Fronteiras (MSF) com receio em não conseguirem amenizar o estado ao qual o país encontra-se. Houve a mobilização de alguns países com a causa, como México e Brasil que enviaram respectivamente, 15,4 toneladas e 10,5 toneladas de ajuda humanitária referentes a medicamentos, alimentos, água, materiais e equipamentos de emergência, a União Europeia (UE) doou o valor de 3,5 milhões de euros.


Outras associações também foram mobilizadas em prol a causa, como Unicef, Caritas, Save the Children e a Fundação de direito Pontifício Ajuda a Igreja que Sofre (ACN), porém a ajuda internacional segue sendo um enorme desafio rotineiro do Haiti, com as circunstâncias deixadas pelos desastres naturais o socorro às vítimas torna-se prejudicado. Com tudo, a má organização do governo dos recursos que chegam ao país já provaram em outras ocorrências recuperações lentas, e como enfraquece e gera dependência da comunidade externa ao Estado haitiano, segundo o professor de Relações Internacionais da PUC Minas João Fernando Finazzi (PAIXÃO. Folha de São Paulo, 2021).


Dentro desta perspectiva, deve ser pontuado que o Haiti com seus antecedentes históricos sustenta-se acima de crises, sejam elas políticas, sociais ou humanitárias, de modo que a rede de apoio por meio da Comunidade Internacional sempre foi necessária como melhor resultado para amenizar os reflexos dos cenários que cresciam associados com a população carente. O incentivo dado pela sociedade internacional a pautas como essas ligadas a um país como o Haiti, tornam-se de extrema importância, diante da instabilidade do cenário global em meio aos anos pandêmicos. Entende-se que para apoio em ocorrências como esta, entre todos os Estados, o interesse deve ser certo na visualização da necessidade de mobilização por parte de uma rede de apoio internacional, para que propague a intensidade da causa e possibilite maior visibilidade.


- Ester Teixeira de Aguiar




Referências:


Caritas, Unicef, ONGs mobilizadas pelo Haiti. ACN destina 500 mil euros em ajuda de emergência. Vatican News, 16 de agosto de 2021. https://www.vaticannews.va/pt/igreja/news/2021-08/haiti-ajuda-igreja-sofre-500-mil-euros-ajuda-emergencia.html Acesso: 12 de setembro de 2021.


Ciclone tropical atinge o Haiti e dificulta busca por sobreviventes de terremoto devastador. G1, 17 de agosto de 2021. https://g1.globo.com/mundo/noticia/2021/08/17/ciclone-tropical-grace-atinge-o-haiti-apos-terremoto-devastador.ghtml Acesso: 12 de setembro de 2021.


Entenda a crise política que o Haiti está enfrentando. Correio do Povo, 11 setembro de 2021, Porto Alegre. https://www.correiodopovo.com.br/not%C3%ADcias/mundo/entenda-a-crise-pol%C3%ADtica-que-o-haiti-est%C3%A1-enfrentando-1.574112?amp=1 Acesso: 11 de setembro de 2021.


GARCÍA, Jacobo. Presidente do Haiti, Jovenel Moïse, é assassinado a tiros em sua casa em Porto Príncipe. El País, Cidade do México, 7 de julho de 2021.


GUITARRARA, Paloma. Terremotos no Haiti. Brasil Escola, 2021. https://m.brasilescola.uol.com.br/amp/geografia/o-terremoto-no-haiti.htm Acesso: 12 de setembro de 2021.


Haiti: entenda crise que culminou na morte do presidente Jonevel Moïse. Correio Braziliense. https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2021/07/amp/4936104-haiti-entenda-crise-que-culminou-na-morte-do-presidente-jovenel-moise.html Acesso: 11 de setembro de 2021.


Haiti recebe 15,4 toneladas de ajuda humanitária enviada pelo México. Bol, 16 de agosto de 2021. https://www.bol.uol.com.br/noticias/2021/08/16/haiti-recebe-154-toneladas-de-ajuda-humanitaria-enviada-pelo-mexico.htm Acesso: 12 de setembro de 2021.


Número de mortos por terremoto no Haiti passa de 2.100; país registra novo abalo. G1, 19 de agosto de 2021. https://g1.globo.com/google/amp/mundo/noticia/2021/08/19/numero-de-mortos-por-terremoto-no-haiti-passa-de-2100-pais-registra-novo-abalo.ghtml Acesso: 12 de setembro de 2021.


PAIXÃO, Mayara. Ajuda internacional é desafio no Haiti após terremoto que matou mais de 1.400. Folha de São Paulo, 16 de agosto de 2021. https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2021/08/ajuda-internacional-e-desafio-no-haiti-apos-terremoto-que-matou-mais-de-1400.shtml Acesso: 12 de setembro de 2021.


PAÚL, Fernanda. Terremoto no Haiti: 'Estamos abandonados, e o povo está desesperado por comida, por alguma ajuda.'. BBC News Mundo, 19 de agosto de 2021. https://www.bbc.com/portuguese/internacional-58267614 Acesso: 12 de setembro de 2021.


PEDUZZI, Pedro. Brasil envia ajuda humanitária ao Haiti. Agência Brasil, Brasília, 22 de agosto de 2021. https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2021-08/brasil-envia-ajuda-humanitaria-ao-haiti Acesso: 12 de agosto de 2021.


Por que ocorrem tantos terremotos no Haiti?. BBC News, 15 de agosto de 2021. https://www.bbc.com/portuguese/internacional-58223572 Acesso: 11 de setembro de 2021.


UE dará US$ 3,5 milhões em ajuda para Haiti após o terremoto. Estado de Minas, 17 de agosto de 2021. https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2021/08/17/interna_internacional,1296686/ue-dara-us-3-5-milhoes-em-ajuda-para-o-haiti-apos-o-terremoto.shtml Acesso: 12 de setembro de 2021.



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