As cadeias globais de suprimento, também conhecidas como supply chain, são redes complexas que conectam a produção e o consumo em diferentes partes do mundo, seja por meio de matérias-primas, informações ou recursos. Para analisar esse sistema é necessário compreender seu funcionamento, tendo em vista que as cadeias globais se baseiam nas relações de consumo de produtos e de bens e serviços, e é por meio delas que uma pessoa pode adquirir um determinado tipo de produto que não existe ou não é fabricado em seu país.
Diante disso, as supply chain performam por meio de elos interligados, assim, é factível que uma matéria prima seja extraída em um país, levada a outro, onde será transformada em produto, e por fim encaminhada a outro para consumo final. Todo esse processo envolve muitos atores e estimula a competitividade de mercado a nível mundial, além de fornecer uma diversidade maior de produtos. Tendo isso em vista, é possível afirmar que esse sistema só foi construído em virtude da globalização, e hoje sustenta uma parte significativa da economia mundial (SEBRAE SC, 2023). Entretanto, com a recente intensificação dos conflitos geopolíticos, as cadeias vêm sofrendo significativo impacto, o que resultou em um aumento dos desafios logísticos, dos custos e a necessidade de reconfiguração de fornecedores (FIEC, 2024). A seguir, exploramos os principais efeitos dessas tensões e algumas estratégias para mitigá-los.
Em geral, as tensões geopolíticas são moldadas por uma complexa interação de fatores históricos, econômicos, sociais e ambientais, e refletem não somente disputas territoriais ou ideológicas, como também questões de poder, segurança e acesso a recursos. Ademais, esses conflitos podem surgir devido a uma variedade de fatores, incluindo conflitos armados, sanções econômicas e rivalidades mercantis — a exemplo desta, tem-se a guerra comercial entre os EUA e a China, que alterou acordos comerciais e provocou um ambiente de incertezas na área de negócios (CNN Brasil, 2021), criando não apenas interrupções diretas, como efeitos indiretos que reverberam em economias ao redor do mundo.
Isto posto, é necessário trazer em pauta as dificuldades que as empresas que dependem dessas cadeias têm encontrado para garantir a continuidade dos seus negócios. Nesse cenário, a capacidade de adaptação das estratégias logísticas tem se tornado crucial para evitar rupturas e minimizar custos.
Uma das consequências imediatas das supply chain é a interrupção das rotas de transporte, causando atrasos ou impossibilitando entregas — o fechamento do Canal de Suez em 2021 ilustra como um único evento pode impactar o globo (Hoffman, 2021). A guerra russo-ucraniana, como outro exemplo, resultou no fechamento de importantes rotas marítimas no Mar Negro, dificultando a exportação de grãos e produtos energéticos, e como a Ucrânia é um dos maiores produtores de grãos do mundo, as interrupções nesse setor têm levado a um aumento significativo nos preços globais dos alimentos. Segundo o Banco Mundial, a guerra contribuiu para uma crise alimentar, afetando especialmente países dependentes de importações de grãos ucranianos. Mais de 40% do trigo da África é importado dos países em guerra, diz o Banco Africano de Desenvolvimento — isso contribuiu para um reajuste de 40% nos preços de comida; na Nigéria, por exemplo, o aumento de produtos como macarrão e pão chegou a 50%. (BBC News, 2022).
Do mesmo modo, a instabilidade política geralmente leva ao aumento dos custos das commodities e a dependência da Europa do gás natural russo resultou em flutuações drásticas de preços, especialmente após as sanções impostas à Rússia. A Agência Internacional de Energia (IEA) relatou que os preços de energia subiram vertiginosamente, afetando não apenas o setor energético, mas também as indústrias que dependem de energia a preços acessíveis (IEA, 2022).
Outrossim, a instabilidade dos conflitos no Oriente Médio impactam de maneira expressiva nos preços globais de petróleo, visto que, essa região é responsável por uma parcela significativa da produção mundial de petróleo. Quando há um aumento nas tensões, os preços do petróleo tendem a disparar, gerando repercussões em várias economias ao redor do mundo. Esse fenômeno pode aumentar a inflação, encarecer o custo dos produtos e, consequentemente, afetar o consumo global (Reuters, 2023). Ademais, a escassez de produtos é um resultado direto dessa instabilidade na área. Por exemplo, diante do conflito entre Israel e Palestina, as crises humanitárias em Gaza e na Cisjordânia limitam o acesso a insumos essenciais, o que afeta não só a população local, mas também o fornecimento de produtos para mercados internacionais que dependem de matérias-primas provenientes da região (Human Rights Watch, 2021).
Além disso, como respostas às incertezas políticas, muitas empresas estão reavaliando seus investimentos. Diversas corporações optam por diversificar suas cadeias de suprimentos para evitar os riscos associados a uma potencial escalada do conflito. Por exemplo, empresas do setor automotivo e de eletrônicos que dependem de componentes fabricados na região estão cada vez mais buscando alternativas em outros mercados, como o Sudeste Asiático ou a América Latina (McKinsey, 2022).
À luz do exposto, é notório o quanto as tensões geopolíticas têm impactado significativamente nas cadeias globais de suprimentos, reverberando na economia mundial e criando desafios que podem comprometer a eficiência e a lucratividade das empresas, exigindo que estas, assim como os governos, implementem estratégias adaptativas para mitigar os riscos. Com a crescente interconexão da economia global, a resiliência das supply chain se tornará um fator crucial para a sobrevivência e o sucesso das empresas em um ambiente volátil. Portanto, estratégias proativas de diversificação, reestruturação e investimento em tecnologia são essenciais para navegar nesse cenário desafiador, reafirmando a importância da diplomacia e da busca por soluções pacíficas para os conflitos existentes. À medida que os impactos dessas crises se desenrolam, a dinâmica do comércio internacional continuará a ser moldada por esses eventos.
REFERÊNCIAS
BBC NEWS BRASIL. Guerra na Ucrânia: por que o mundo precisa dos grãos vendidos pelo país? Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/internacional-62272076.amp>. Acesso em: 4 de nov de 2024.
HUMANS RIGHTS WATCH. Gaza: Israel’s northern offensive endangering hundreds of thousands of civilians. Disponível em: <https://www.hrw.org/news/2024/10/26/gaza-israels-northern-offensive-endangering-hundreds-thousands-civilians>. Acesso em: 3 nov. 2024.
INTERNATIONAL ENERGY AGENCY. World Energy Outlook 2022. Disponível em: <https://www.iea.org/reports/world-energy-outlook-2022>. Acesso em: 3 nov. 2024.
MAXTON LOGÍSTICA. Tensões geopolíticas nas cadeias de suprimentos globais. Disponível em: <https://maxtonlogistica.com.br/tensoes-geopoliticas-nas-cadeias-de-suprimentos-globais/>. Acesso em: 30 out. 2024.
MCKINSEY. Taking the pulse of shifting supply chains. Disponível em: <https://www.mckinsey.com/capabilities/operations/our-insights/taking-the-pulse-of-shifting-supply-chains>. Acesso em: 3 nov. 2024.
PACHECO, P. Disputa entre EUA e China reforça estratégia empresarial de redistribuir produção. Disponível em: <https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/disputa-entre-eua-e-china-reforca-estrategia-empresarial-de-redistribuir-producao/>. Acesso em: 3 nov. 2024.
REUTERS. Geopolitical risk premium in oil market slips slightly, Goldman Sachs says. Disponível em: <https://www.reuters.com/business/energy/geopolitical-risk-premium-oil-market-slips-slightly-goldman-sachs-says-2024-10-09/>. Acesso em: 3 nov. 2024.
SEBRAE. Cadeia de suprimentos global. Disponível em: <https://www.sebrae-sc.com.br/blog/cadeia-suprimentos-global#:~:text=O%20que%20%C3%A9%20uma%20cadeia,servi%C3%A7os%20cheguem%20eficientemente%20aos%20consumidores>. Acesso em: 30 out. 2024.
SEBRAE-SC. Cadeia de suprimentos global: desafios e oportunidades. Disponível em: <https://www.sebrae-sc.com.br/blog/cadeia-suprimentos-global#:~:text=A%20globaliza%C3%A7%C3%A3o%20tem%20intensificado%20o,com%20m%C3%BAltiplos%20elos%20e%20intera%C3%A7%C3%B5es>. Acesso em: 30 out. 2024.
SFIEC. Assessor econômico da FIEC comenta impactos dos conflitos geopolíticos na inflação global. Disponível em: <https://www1.sfiec.org.br/fiec-noticias/search/160610/assessor-economico-da-fiec-comenta-impactos-dos-conflitos-geopoliticos-na-inflacao-global#:~:text=Quando%20as%20diferen%C3%A7as%20geopol%C3%ADticas%20extrapolam,de%20insumos%2C%20bens%20e%20servi%C3%A7os>. Acesso em: 30 out. 2024
THE ECONOMIST. Why the Suez Canal and other choke-points face growing pressure. Disponível em: <https://www.economist.com/the-economist-explains/2021/03/26/why-the-suez-canal-and-other-choke-points-face-growing-pressure>. Acesso em: 3 nov. 2024.
WORLD BANK. The impact of the war in Ukraine on food security. Disponível em: <https://www.worldbank.org/en/news/video/2022/04/05/the-impact-of-the-war-in-ukraine-on-food-security-world-bank-expert-answers>. Acesso em: 3 nov. 2024.
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